Arcozelo das Maias é uma freguesia rica em tradições que têm sido conservadas pelos seus dedicados habitantes, contribuindo, desta forma, para o enriquecimento da cultura local. Do vasto e interessantíssimo conjunto de usos e costumes, as rezas e orações apresentam-se como uma das mais respeitadas, pois caminha ao lado da religiosidade. Pela sua importância cultural, passam-se a enunciar algumas delas, que ainda hoje fazem parte do dia-a-dia das pessoas mais antigas da freguesia.

 

Oração da Manhã

Bendita seja a luz do dia,
Bendito seja quem a cria,
Bendito seja o Filho da Virgem Maria
Assim como Ele aparta a noite e o dia,
Aparte o meu corpo e alma da ruim companhia.
Padre Nosso... Avé Maria...

 

Oração da Noite

Com Deus me deito, com Deus me quero deitar
Minha alma ao Senhor
E a Nossa Senhora quero entregar.
E se em qualquer hora desta noite morrer
E por Vós não puder chamar,
Direi três vezes:
- Salvai-me Senhor, salvai-me Senhor, Senhor salvai-me.
Padre Nosso... Avé Maria...

 

Oração para Quando a Gente se Levanta

Encomendo-me a Deus e à luz
E à Santa Vera Cruz
E ao Rei da Virgindade
E à Santíssima Trindade,
E à árvore de Jesus Cristo
Que é a quem eu peço que me defenda
De todos os meus inimigos
Mortos e vivos, nascidos e por nascer,
Baptizados e por baptizar,
Do mais pequeno até ao Meiroal,
P' ra que eu não tenha perigo nem mal.
Senhor Santo Antão meu bem
Me livre de quantos demónios
A terra, o ar e o inferno tem,
Do pequeno e do grande e do Meiroal também.
E o Anjo da Guarda me guarde de noite e de dia,
Que ande sempre na minha companhia.
Padre Nosso... Avé Maria...

 

Oração Para Dizer entre a Hóstia e o Cálice

Senhor do Horto, fostes vivo e fostes morto,
Perdoastes a vossa morte, tão cruenta e tão forte,
Perdoai-me os meus pecados
Esquecidos e “alembrados”.
- Fui aos pés do meu confessor,
Não me pude confessar,
Perdoai-me meu Divino Senhor
Que “sende-lo” Rei da Verdade.
Minhas pragas, juras e mentiras,
Todas as ofensas e mal que eu tenho feito,
Mil vezes Vos peço perdão Senhor
Pelo Vosso sofrimento
E espero alcançar o infinito merecimento
Padre Nosso... Avé Maria...

 

Oração do Justo Juiz de Nazaré

Justo juiz de Nazaré,
Filho da Virgem Maria
Foi nascido em Belém,
No Vale de Nazaria;
Foi crucificado
Entre toda a judiaria.
Eu vos peço meu Divino Senhor
Pelo Vosso sexto dia
Que me guardeis o meu corpo,
Que não seja tentado, nem roubado,
Nem preso, nem ferido, nem morto,
Nem nada “envolto”.
Pax tecum, pax Cristi,
Disse o Senhor aos seus Discípulos:
- Se vierem os meus inimigos p' ra me prenderem,
Tenham boca e não me falem,
Tenham mãos e não me ofendam,
Tenham pernas e não me alcancem.
Com as armas de São Jorge armada,
Com a capa do capelão apeada,
Com o leite de Nossa Senhora esborrifada,
P' ra que nada me possa fazer mal,
Nem sangue do meu corpo tirar.
Aquelas três Hóstias benzidas,
Aqueles três Cálices consagrados,
Aqueles três clérigos vestidos
Que vão e que vêm ao terceiro dia
Com prazer e alegria,
Assim como veio Nosso Senhor
Do ventre da Virgem Maria.
Padre Nosso... Avé Maria...

 

Responso a Santo António
(Para nos livrar de intrigas, falsos testemunhos e fazer voltar o perdido ou roubado.)

- Ó Beato Santo António que em Lisboa foste nado,
Em França visitado e em Roma coroado,
Pelo cordãozinho que cingiste, pelo livrinho que rezaste.
Na casa de Santa Paula tuas mãozinhas lavaste.
Peixinhos da água se levantaram
Para ouvirem a tua santa pregação.
- Santo António, p' ra onde vais?
- Eu, Senhor, convosco vou!
- Tu Comigo não irás, tu na Terra ficarás,
Todo vivo guardarás,
Todas as coisas esquecidas “alembrarás”,
Todas as coisas perdidas acharás...
- Em busca, em busca São Silvestre,
Tamanha boca, tamanho sestro:
Se a tiveres fechada não a abrirás,
Se a tiveres aberta não a fecharás.
Tem-te, tem-te Madalena, que mas queiras “alembrar”,
Estas são as Cinco Chagas que por nós têm de passar,
Pequenino pelo grande, para a todos Deus nos Salvar.
- Assim como Santo António livrou seu pai de sete sentenças falsas,
Assim nos livre da má fama, da má companhia,
E nos guarde os nossos animaizinhos e as nossas coisinhas
De noite e de dia.
Padre Nosso... Avé Maria...

 

Responso
(Diz-se quando se perde alguma coisa, ou roubam ou para nos livrar de algum mal)

Juízo do juízo, Nazareno, filho da Virgem Maria
Em, Belém foste nascido entre dias, idolatrias
Tanto peço Meu Senhor Jesus Cristo
Por este Sexto dia digo esta oraçãozinha
Que me guarde a minha família ou objecto
E todos os meus haveres pequenos e grandes,
Grandes e pequenos, Paz técula e Paz Cristo
Com as armas de São Jorge sejamos armados
Com as espadas de Abraão
E o leite de Nossa Senhora seremos sarrufados
Com o sangue de Nosso Senhor Jesus Cristo
Seremos baptizados
Na arca de Noé seremos arrecadados
Com as chaves de São Pedro seremos fechados
Onde não possam ver, nem ferir,
Nem prender, nem sangue de nosso corpo tirar
Por aqueles três calventes
Por aqueles três padres revestidos
Aquelas três hóstias consagradas
Ao 3º dia Deus diante, paz na guia
Deus nos dê companhia
E às casas de Belém até Jerusalém
E o Senhor é nosso pai e a
Virgem Maria nossa mãe
E por todos os santinhos e santinhas Milagrosos Padre Santo António
Pela sua apostolidade foi servido ao guardar
O seu pai da morte
E assim guarde tudo quanto eu nomeei
De perigos e trabalhos, atribulações e malfeitores
Maus vizinhos de ao pé da porta
De cães danados e por danar e de todo o bichinho
Que por baixo e por cima da terra andarem
- Credo em Deus Pai...

 

Padre Nosso Pequenino

Padre Nosso pequenino
Quando Deus era menino
Santa do nosso altar com livro a rezar
Três velas a alumiar
O Senhor é meu padrinho
A Senhora minha madrinha
Faça-me uma cruz na testa
Que o mal não me impeça
Nem de noite nem de dia
Nem ó pio meio dia
Já os galos cantam,
Já os anjos se “alevantam”
Jesus na cruz para sempre. Amen!

 

Antigamente, devido à falta de conhecimentos científicos que justificassem determinados factos ou doenças, o povo de Arcozelo das Maias atribuía as suas causas a fenómenos sobrenaturais, aos quais estavam associadas certas superstições. Qualquer fraqueza física ou psicológica era vista como um mal de inveja, que tinha de ser “talhado” com a respectiva reza. Solução idêntica era dada para a dor de um dedo ou de cabeça, para o desaparecimento de algum objecto, para uma entorse, enfim, para quase tudo.

Hoje em dia, as superstições e as orações que lhes estão associadas já não têm a força de outros tempos, mas também não estão esquecidas, sendo ainda possível ouvir das pessoas mais antigas superstições/ orações como as que a seguir se apresentam.

 

Espinhela Caída

Quando as pessoas andam enfraquecidas por má alimentação ou por cansaço, diz-se que têm a “espinhela caída” e só a rezadeira a pode curar. Para isso, o doente senta-se no chão térreo, com as pernas bem estendidas e unidas, os dedos polegares dos pés bem juntos e os braços pendentes e entorpecidos. A senhora que faz a reza fica de pé, por trás do doente, e com as suas mãos pega nos dedos polegares do paciente, dá umas sacudidelas e vê se há dormência. Em seguida, puxa verticalmente e para cima os dois braços, até que fiquem ao alto, aproxima os dois polegares e verifica se um dos dedos ficou mais acima e outro mais abaixo. O não “ugar” dos dedos polegares da paciente, ou seja, caso não estejam ao mesmo nível, é que é o sinal da “espinhela caída” que será tanto mais caída quanto maior for a diferença de altura entre os dois dedos. A rezadeira parte do princípio que puxou igualmente pelos dois braços.

Começa então a reza. Diz cinco vezes o credo, sem se enganar em nenhuma palavra, fazendo cruzes nas costas do paciente. Depois unta os nervos (tendões) dos dedos dos pés, das mãos e dos pulsos com azeite e, ao mesmo tempo, vai dizendo: “(nome do doente), tens tu a espinhela caída, o teu ventre, o teu baço ou tombado, ou arejado, ou desmantido, ou desmanchado.
A Senhora da Encarnação ponha tudo no seu lugar e no seu são. Pelo poder de Deus e da Virgem Maria, padre Nosso e Avé Maria.”

Profere-se esta reza até que todos os dedos e nervos estejam untados de azeite (a cada frase corresponde uma untadela). No final, a rezadeira volta a puxar os dedos polegares do doente, ergue-lhe os braços no ar e verifica se os dois polegares já ficam ao mesmo nível, ou seja “ugam”.

Finda a cura, o paciente traz ainda uma “receita” para ser cumprida à risca: durante três dias não pega em carregos, nem abre caixa ou maceira, nem pega em meninos e de manhã, em jejum, come cinco, sete ou nove (nunca número par) talhadas fritas de carne da banda de porco e bebe todo o molho da fritura misturado com um quarteirão de vinho... E ficará escorreita e pronto para retomar o trabalho.

 

Reza do Quebranto ou Mau Olhado

Antigamente, acreditava-se que certas mulheres tinham poderes sobrenaturais, sendo, por esse motivo, chamadas de bruxas ou feiticeiras. Dizia o povo que eram elas que, movidas pelo ciúme e pela inveja, lançavam o “mau olhado”. Segundo a tradição, as vítimas deste mal tinham alterações de comportamento, ficando cismadas, tristes, sem alegria de viver e muitas vezes com ideias suicidas. Para combater este problema, os doentes tinham que recorrer a uma pessoa com poderes para talhar o quebranto. Para tal, essa pessoa desenvolvia a seguinte prática: durante sete dias, fazia uma grande fogueira, tirava as brasas maiores e colocava-as dentro de uma bacia com água, uma a uma, para, logo que apagadas, se afundassem. O mau olhado estava talhado quando as brasas ficassem a flutuar na água. Mas, só com a reza do quebranto ou mau olhado era restituída a saúde. Por isso, a rezadeira enquanto ouvia a queixa da vítima, tirava o chapéu, concentrava-se e dizia em voz alta:
De Sant' Ana nasceu Maria,
De Maria nasceu Jesus, de Santa Isabel, São João,
Quebrantos e maus olhados
P' ró mar coalhados vão.
As pessoas da Santíssima Trindade são três,
E assim como Elas querem e podem,
De onde este mal veio p' ra lá torne.
Pelo poder da Virgem Maria,
Padre Nosso e Avé Maria.

Outra versão:

Jesus e Jesus, Altíssimo Nome de Jesus
A dizer palavras do quebranto
Se tu na tua cabeça
Tens quebranto ou olhado
De mau homem ou má mulher
Ou de rapaz ou de rapariga
Ou de olho de má gente,
Ou de cobra ou cobrelo ou de sapo ou sapelo
Que dois tu deram e três tu tiram
O Senhor e a Senhora e toda a
Pessoa da Santíssima Trindade
Donde este mal para lá veio
Assim há-de para lá tornar
Padre Nosso... Avé Maria..

E ainda outra versão:

Jesus que é o Santo nome de Jesus
Onde está o Santo Nome de Jesus
Não entra mal nenhum
Eu te benzo, criatura do olhado
Se for na cabeça a Senhora da Cabeça;
E se for na cara, a Senhora de Santa Clara;
E se for nos braços, o Senhor de São Marcos;
E se for nas costas, a Senhora das Verónicas;
E se for no corpo, o Senhor Jesus Cristo, o que tem o poder todo.
Santa Ana criou a Virgem Maria e esta o meu Senhor Jesus Cristo,
E assim como isto é verdade, assim este olhado daqui tirado para as ondas do mar seja lançado, para onde não ouça galos nem galinhas cantar
Em louvor de Deus e da Virgem Maria
Padre Nosso e Avé Maria.

Esta benzedura fazia-se com o terço na mão. Rezava-se uma Salvé Rainha e dizia-se nove vezes em cada vez que se fazia o exorcismo.

 

Reza do Unheiro ou Olheiro

O unheiro é um tumor ou infecção que surge entre qualquer dedo ou unha, do pé ou da mão. O olheiro, por sua vez, era a designação dada à dor ou mal nos olhos. Para a cura de ambos, tinha de ser rezado o “unheiro” ou o “olheiro”, conforme a situação, sendo usada a mesma reza, apenas com as alterações no princípio e a meio e que se assinalam entre parêntesis.
Ao mesmo tempo que se proferia a oração, a rezadeira fazia cruzes no ar com a mão direita sobre o dedo ou olho do paciente.

Unheiro (olheiro)
Vai-te pelo carreiro,
Vai-te pelo tojeiro,
Vai-te p' ró mar
Vai-te afogar,
Vai-te esconjurar,
Deixa o dedo (o olho) desta criatura
Para poder caminhar (ver) e trabalhar
E dormir e descansar
E por este mundo andar.
Em louvor da Virgem Maria,
Padre Nosso... Avé Maria...

ou:

Santa Luzia, Santa Iria,
Três novelinhos de ouro trazia:
Um com que urdia,
Outro com que névoas, úlceras,
Cabritas, rabitas e unheiros desfazia
Com o poder da Virgem Maria,
Padre Nosso e Avé Maria...

 

Talhar o Sol

As dores de cabeça e o estado febril eram sintomas de quem tinha apanhado muito sol. Por isso, para resolver o problema era necessário talhar o sol, procedendo-se do seguinte modo: manda-se sentar o paciente. Em seguida, dobra-se uma toalha felpuda em três dobras e ajusta-se-lhes a meio e de borco um copo cheio de água fria, apertando bem o copo contra a toalha para a água não vazar e coloca-se tudo sobre a cabeça do doente.

A rezadeira segura com a mão esquerda o copo “brocado” e com a mão direita vai fazendo as cruzes no ar por sobre a cabeça, enquanto diz:
Maria perguntou a Jesus
Como o sol se talharia:
Com uma toalha lavada
E um copo de água fria

Em louvor de São José
E da Virgem Santa Maria
Que esta doença se cure
Nesta hora e neste dia
Padre Nosso... Avé Maria...

Como a toalha vai absorvendo a água esta, ao descer no copo, faz subir bolhinhas de ar para o espaço que vai ficando vazio, parecendo que está em ebulição. Então a rezadeira diz:
- Tinhas tanto Sol que a água até ferveu. Aquelas bolinhas que subiam pela água era o Sol que estava a sair da tua cabeça.

A sensação agradável que o paciente sentia resultante da frescura da água que atravessava a toalha e atingia a sua cabeça febril, era considerada a cura.
Raras eram as pessoas que recorriam a médicos para resolver este problema e quando eram chamados, a maior parte das vezes já a doença não tinha cura.

 

Responso para os cães não morderem

Quando Nosso Senhor pelo mundo andou
Nem cão nem cadela ladrou
Cão do diabo,
Agacha o focinho e “alavanta” o rabo!...

Depois de dizer este responso, vira-se com o dedo polegar do pé esquerdo, uma pedra do caminho, de modo a que a parte que estava voltada para baixo fique para cima. Já os cães não mordem a gente!

 

Reza para Talhar a Peste Malina

Jesus, nome de Jesus,
Quando o Senhor pelo mundo andou,
Ao pé da palma se assentou
Lá lhe apareceram Pedro e Paulo
E o Senhor lhes perguntou:
“Mia (meia) gente é viva, mia (meia) gente é morta
Torna-te lá Pedro que tudo talharás
Com água de funcho e aipo, tudo curarás
E o mal nunca mais lavrará.”
Pelo poder de Deus e da Virgem Maria,
Padre Nosso... Avé Maria...

 

Para Talhar o Coxo

Quando alguns animais com peçonha passam pelas pessoas, entrando em contacto com a sua pele, aparecem uns males de pele no corpo ou nos lábios, denominados pelo povo de coxo.

Estes males não passam rapidamente, mesmo quando se lavam com água de malvas fervidas e sabão e têm de ser talhados. Para isso, pega-se na faca da cozinha e fazem-se cruzes por cima da zona do corpo onde está a peçonha, dizendo:

Aranha e aranhão,
Sapo e sapão
Todo o bicho da maldição
Que anda de zorro pelo chão
Eu te talho com a faca do meu pão
Para que andes para trás
E para diante não!
Em louvor de São Simão e
De São Silvestre
Tudo o que eu fizer de madrinha preste!

 

Benzedura do Nervo Torcido

O nervo torcido corresponde às entorses e luxações, também designados por ossos desencaixados, ossos desmanchados ou jogas torcidas. Para as tratar, faz-se a benzedura do nervo torcido que, repetidas nove vezes, alivia as dores. E diz quem benze:

Jesus que é o Santo nome de Jesus,
Onde está o Santo nome de Jesus,
Não entra mal nenhum.

Outra pessoa vai cosendo um pano com uma agulha e um novelo de linhas, ao mesmo tempo que diz:
- Eu coso.


Quem está padecendo responde:
Carne quebrada e nervo torto,
Cose a Virgem melhor quer eu coso.
A Virgem cose pelo são e eu coso pelo vão.
Em louvor de Deus e da Virgem Maria.
Padre Nosso... Avé Maria...

Depois de feita a benzedura, molham-se os dedos em azeite, esfrega-se a parte dorida e reza-se um Padre Nosso e uma Avé Maria a Santo Amaro, advogado das pernas e braços, e oferece-se à Sagrada Morte e Paixão do Nosso Senhor Jesus Cristo.

 

Reza para Talhar a Peçonha e os Herpes

Diz-se a reza esfregando saliva na cara da pessoa que tem peçonha

O rio Douro passei
E ao rio Águeda e à ria “tinhaga” cheguei
E os herpes e os acre e a peçonha talhei
Com a ajuda de Santa Quitéria
E a Senhora do Pilar,
Me ajudem este mal a talhar
Para trás tornarás
P' ra diante não lavrarás
Pelo poder de Deus e da Virgem Maria
Padre Nosso... Avé Maria...

Outra versão :

Jesus e Jesus, Altíssimo Nome de Jesus
A dizer palavras da peçonha
Se tu tens peçonha de cobra ou cobrelo
Ou de sapo ou sapelo ou alguma
Peçonha que pelo chão esteja espalhada
Lá vem Santa Ilha pedindo à sua filha Maria
Que ao Sol e à Lua com que este mal se curaria.
Com saibinho da boca
Padre Nosso... Avé Maria...

 

Reza para Talhar a Peçonha

Quando passa um bicho peçonhento pela roupa que se veste ou directamente pelo corpo e aparece uma baba com muita comichão, tem de se talhar a peçonha. Para tal, tomam-se cinco carvões pequenos e diz-se a reza cinco vezes. De cada vez usa-se um carvão com o qual se fazem cruzes sobre o mal, enquanto se reza:

Bicho, bichão, aranha, aranhão, cobra, cobrelo, cobrão,
Sapo, sapão, lagarto, lagartão, todo o bicho mau desta Nação
Fique tão seco, tão esmirrado como este carvão
Pelo poder da Virgem Maria,
Padre Nosso e Avé Maria...

De cada vez que se acaba atira-se o carvão servido para trás das costas e com ele se vai o mal embora cinco vezes.

Outra versão:

Diz-se, molhando o polegar em saliva e fazendo cruzes com o dedo esfregando sobre o mal:
Jesus, Jesus, santíssimo Nome de Jesus
Se esta criatura tem o mal da peçonha
Que o sapo sapelo ou cobra cobrelo apegou,
Ou peçonha no chão estaria
E seu corpo apanhou
Ao sol e à Lua, pelo poder da Virgem Maria
Com saibinho da boca se curaria
Padre Nosso, Avé Maria.

 

Reza para Talhar a Eripsela ou Zerpelão

A eripsela ou zerpelão são as feridas consequentes das infecções da pele e dos tecidos moles, frequentes na população rural, devido às condições de trabalho. Para as tratar recorria-se a variadas mezinhas. Quando estas não resultavam fazia-se a benzedura da erisipela, dizendo quem benze:

Jesus, que é o Santo nome de Jesus,
Onde está o santo nome de Jesus, não entra mal nenhum.

E diz ainda, fazendo o sinal da cruz:

Paulo e Louro vinham de Roma e com o Senhor se encontraram.
O Senhor lhes perguntou:
- De onde vindes Paulo e Louro?
- Nós vimos de Roma, Senhor:
- Que notícias trazem de lá?
Respondendo ao Senhor lhe disseram.
- Muitas erisipelas e maus ares.
- E como se curam?
O Senhor respondeu-lhes dizendo:
- Com esparto do mato
E com as pinguinhas de água fria, em louvor de Deus e da Virgem Maria.
Padre Nosso e Avé Maria

Repete-se esta benzedura nove vezes, molhando o esparto com água fria e salpicando a pessoa no sítio onde está a erisipela.

Outra versão:

- Pedro e Paulo de onde vens?
- Senhora, venho de Roma
- Pedro e Paulo, que vai por lá?
- Muita zirpa, muita zirpela e zerpelão
- Pedro e Paulo tomai lá:
Talha e acerca com óleo de oliva,
Flor de monte e água da fonte
Pelo poder da Virgem Maria
Padre Nosso... Avé Maria...

 

Reza para quando se prega um botão

Quando se prega um botão a um menino, com a roupa vestida, tem que se dizer esta oração ou reza, senão a criança não medra (desenvolve) mais e corre o risco de lhe surgir qualquer mal

Eu te coso ponto esforricoso
Eu a coser, o ponto a apodrecer
O meu menino a crescer
E o Senhor tudo pode fazer
Com o poder da Virgem Maria
Padre Nosso... Avé Maria...

 

Reza para quando se amassa o Pão

São Vicente te acrescente,
São Mamede te levante,
São Frei Gil te faça vir,
São Abraão te faça pão,
E nós a comer, e tu a crescer,
Tudo Deus pode fazer
Padre Nosso... Avé Maria...

 

Reza ao Rendido

Quando um homem é rendido, deve atar à volta da rendição uma faixa de pano de lençol, e no meio das voltas que há-de dar em torno da barriga e partes baixas, pôr uma pedra lousa (ou tábua) muita plana, para aconchegar. Estando assim protegido, se tiver de fazer força, não será fácil que as tripas saiam pela fraqueza da rendição da pele.

Diz-se também quando se torce pés, braços, etc.

Jesus e Jesus, Altíssimo Nome de Jesus
A dizer palavras do rendido
Nosso Senhor seja servido
Se tu tens no teu braço esquerdo ou direito (onde estiver o mau jeito)
Se tens osso quebrado, esmigalhado, rendido
Ou fora do seu lugar
Com algum membro desirmanado,
Ou alguma veia retorcida, embruxada ou reforçada
Padre Nosso... Avé Maria...

 

Benzedura das Constipações

Os trabalhos agrícolas expõem a comunidade rural a determinadas doenças (gripes e resfriados, entre outras), frequentes em qualquer época do ano e devidas às mais variadas circunstâncias climatéricas. Para as tratar, faz-se a reza das constipações. E diz quem benze:

Jesus, que é o Santo nome de Jesus,
Onde está o Santo nome de Jesus, não entra mal nenhum.
Eu te benzo constipação, em louvor de Deus e do Senhor São Simão.
Se é constipação do Sol,
Eu te benzo em louvor de Deus e do Senhor Santo Maior.
Se é constipação do calor,
Eu te benzo em louvor de Deus e do Senhor São Salvador.
Se é constipação de vento,
Eu te benzo em nome de Deus e do Santíssimo Sacramento,
E se é constipação de ar,
Eu te benzo em nome de Deus e do Santo Amaro,
E se é constipação de ar frio com ar quente,
Eu te benzo em nome de Deus e do Senhor São Vicente,
E se é constipação de água,
Eu te benzo em nome de Deus e do Senhor São Tiago,
E se é constipação de água fria,
Eu te benzo em nome de Deus e da Virgem Maria.
Se é de frieza, eu te benzo em nome de Deus e de Santa Teresa,
E se é constipação que veio de corpo de criatura, repentina,
Eu te benzo em nome de Deus e de Santa Catarina,
Com esta santa segunda, com esta santa terça,
Com esta santa quarta, com esta santa quinta,
Com esta santa sexta, com este santo sábado e com este santo domingo,
Que é santo dia em que Nossa Senhora benzeu o bendito Filho e se achou bom.
Seja servido tirar a constipação do corpo desta criatura:
Da cabeça, da garganta, das costas, dos braços, do peito, da barriga, das cadeiras, das pernas e das conjunturas do corpo todas.
Onde eu ponho a minha mão põe o Senhor a Sua virtude;
Não é minha, é de Deus e da Virgem Maria.
Padre Nosso... Avé Maria...

Repete-se nove vezes e oferecem-se este Padre Nosso e esta Avé Maria ao santo ou santa do dia em que esta oração é aplicada à Mãe Santíssima.

 

Benzedura da Dor de Cabeça

Frequentes são também as dores de cabeça provocadas por longas exposições ao sol, enxaqueca, hipertensão arterial, entre tantas outras patologias. Quando se tornam persistentes, recorre-se à reza da dor de cabeça. Quem benze diz o seguinte:

Jesus que é o Santo Nome de Jesus
Onde está o Santo Nome de Jesus, não entra mal nenhum.
Quando a Nossa Senhora pelo mundo andou
Com a dor de cabeça se encontrou
E a Nossa Senhora lhe perguntou:
- Onde vais dor de cabeça?
Ela lhe disse:
- Vou fazer doer a tua cabeça e martirizar o teu miolo,
E Nossa Senhora lhe disse:
- Não me hás-de fazer doer a minha cabeça
E nem hás-de martirizar o meu miolo
E eu te benzo dor má, eu te benzo dor de recha,
E eu te benzo dor de caquita,
Eu te benzo todas as qualidades de dor que tiver,
Na cabeça desta criatura,
E eu te esconjuro para as outras bandas das águas do mar,
Que aqui não é a tua morada,
E eu te benzo em louvor do Senhor e da Virgem Maria.
Padre Nosso... Avé Maria...

É dita nove dias, a nove vezes cada dia.

 

Benzedura da Dor de Barriga

As vulgares dores de barriga por diarreias, cólicas abdominais, dores  menstruais ou outras, também se apresentavam como algo de sobrenatural, pelo que se procede à reza da dor de barriga para as combater. Diz quem benze:

Jesus que é o Santo Nome de Jesus
Onde está o Santo Nome de Jesus, não entra mal nenhum
Quando a Nossa Senhora pelo mundo andava,
Chegou a casa de um homem manso e uma mulher brava, pedindo pousada.
O homem dava e a mulher não.
Onde Nossa Senhora se foi deitar,
Água por baixo e água por cima;
Com estas mesmas palavras, cura a dor de barriga,
Em louvor de Deus e da Virgem Maria.
Padre Nosso... Avé Maria...

Esta oração tem de ser dita nove vezes.

 

Estas rezas centenárias vão passando de pais para filhos (mais de mães para filhas), por tradição oral, e por isso podem tomar novas formas e até alterações, chegando a circular na mesma aldeia diferentes versões algumas com palavras de difícil explicação.

 

Uso de Amuletos

Desde os primórdios que o homem, devido à falta de conhecimentos, teme espíritos maus, a magia negra, os feiticeiros e crê que certos objectos usados consigo ou colocados em sua casa têm poderes estranhos e sobrenaturais, mantendo afastados os demónios, os maus olhados, as desgraças, e todos os malefícios. Esses objectos são os chamados amuletos e fazem a ligação do espiritual ao material.

Os exemplos mais comuns são a figa, o sino saimão (Sansalimão), o chifre mínimo, a unha ou garra de leão ou tigre, corações, cruzes, medalhas, etc., que se usam ao pescoço. A ferradura e o sino saimão usam-se às portas das habitações, nos currais dos animais e nos carros de transporte. O espantalho, nos campos, para a terra produzir e espantar os pardais. A cruz e o sino saimão no jugo dos bois é para afugentar o demónio, as bruxas e outras coisas ruins e não empecer os animais. O chifre é o símbolo da força.